Frei Rogério propõe plano de ação para lidar com as pessoas em situação de rua

Em evento ocorrido na última semana, o Frei Rogério Soares, da Igreja das Mercês, apresentou um verdadeiro plano de trabalho para lidar com a questão dos moradores de rua em todo o Distrito Federal. A linha de trabalho foi construída após 10 anos de observação, com ênfase em Salvador-BA, de onde conseguiu desencadear políticas públicas capazes de não somente acolher tais pessoas, mas também de lhes concederem a cidadania renegada.

Em seu plano, o Frei Rogério destaca que há muitas pessoas e entidades que se aproveitam da causa para barganhar recursos públicos a troco de poucas e ineficazes ações. Enquanto isso, o número de moradores de rua segue crescendo e pelos mais variados motivos: problemas famílias, mentais, estilo de vida, dependência química, despejo, pobreza, desigualdade social etc.

Diante disso, ele observou que os trabalhos devem ocorrer de maneira multifacetada, uma vez que não se pode e não seria correto fazer o mesmo julgamento de quem hoje reside sobre o relento das calçadas. “Costumo dizer que se temos 1000 pessoas em situação de rua, devemos ter 1.000 soluções, pois cada caso é um caso, cada situação muda muito de uma para a outra. […] não podemos colocar as pessoas em situação de rua em um mesmo balaio e achar que todos são iguais”, salienta.

E é justamente por conta desta variedade de motivações que ele apresentou um plano de trabalho que destaca a necessidade de uma ampla e articulada ação envolvendo o Estado com todos seus serviços, sociedade civil organizada, Igrejas, Comunidades Terapêuticas, Albergues, Repúblicas, casas de acolhidas, Segurança Pública, Empresários e ONGs que trabalham com a rua. Com isso, a ideia é garantir ajuda a quem precisa de forma transitória, digna e cidadã, de forma que a pessoa não se acomode com o peixe recebido, mas que decida mudar de vida e ir pescar o seu peixe de cada dia.

O projeto parte de uma perspectiva macrorregional para o microrregional com a participação direta de Estados e Municípios e os demais organismos citados, a fim de não somente evitar a marginalização e a criminalidade, como também apontar soluções específicas para casos e problemas específicos sem julgamento ou puro oportunismo político e financeiro. “O que faço é por amor as pessoas. Ver uma pessoa morando na rua mexe profundamente comigo, sofro muito e por isso quero sempre fazer alguma coisa aonde vou. Aqui em Brasília, podemos fazer muito, mas precisamos nos unir, nos dar as mãos, fazer um pacto, resolver o problema. É possível. Devemos agir como um pai que ama e age de forma sábia, para salvar seu filho”, observa.

Iniciativa elogiada e incentivada

Após a apresentação do Frei Rogério Soares, Júlio Danilo de Souza Ferreira, secretário executivo da Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal (SSP/DF), destacou que a sua pasta tem desencadeado uma série de ações de combate a aglomerações criminosas em diversas regiões do estado, além de buscar catalogar os espaços de maior tráfico de drogas e presença de moradores de rua com vistas ao incentivo à cultura e à atividade comercial. “A gente não pode deixar essas pessoas nessas condições de rua, sem dignidade. A gente acaba prejudicando também o desenvolvimento de atividade comercial que gera emprego, gera renda, e emprega diversas famílias. […] Então a gente está desenvolvendo ações em diversas frentes que se complementam e não tenham dúvidas de que a atuação dos senhores é fundamental para que a gente tenha aí no final a solução para os diversos casos”, disse.

Elaine Rangel, Chefe de Gabinete da SEDES-DF, ressaltou a importância da parceria público-privada e a necessidade das ações serem contínuas. Ela também falou da preocupação de sua secretária em relação aos moradores de rua e destacou algumas ações que estão sendo realizadas para aliviar a dura vida dessas pessoas. “Hoje nós temos algumas OSC’s e isso também tem nos ajudado seja nas unidades de acolhimento, seja no apoio da equipe de abordagem e a gente tem tentado melhorar cada vez mais. Hoje nós estamos com um edital em andamento para mais mil vagas de acolhimento. Serão 10 lotes divididos com 100 vagas, também estamos pensando em várias outras estratégias como uma possível pernoite, coisas que vieram das próprias ideias do “Barba”, do Caio, dos meninos do setor. Então a gente tem acolhido isso e tem visto as possibilidades de isso ser efetivado. A secretária Maiara está muito empenhada e muito preocupada no sentido acolher e dar resolutividade”, destacou.

O Coronel Alan, da Defesa Civil do DF, ressaltou que o órgão tem realizado algumas abordagens no setor comercial do DF, com vistas a conhecer melhor a situação das pessoas que por ali vivem e assim poder entregar cestas básicas, mas que este trabalho demanda de parceiros e de uma ampla articulação. “Nós temos o que doar, porém eu preciso saber quem precisa. Então, quem tiver o nome, o endereço, uma referência, nos passe, que nós iremos até a casa dele levar para evitar que ele volte a ficar naquela situação de rua”, solicitou.

O Subsecretário de Enfrentamento às Drogas da Sejus do DF, Rodrigo Barbosa, destacou o papel fundamental das comunidades terapêuticas no acolhimento de moradores de rua que sofrem com a dependência química, bem como dos esforços para garantir a testagem e o seguimento dos protocolos de enfrentamento a pandemia do novo coronavírus nessas entidades. Ele também observou que é preciso tomar algumas medidas para garantir a reinserção social. “Outros cenários que vão acontecer mais pra frente: tem um monitoramento dessas pessoas que vão ser inseridas no tratamento e, posteriormente, trabalhar com a reinserção social; aquelas pessoas que vão se qualificar, que precisam se alfabetizar, a gente sabe que é uma população que a gente precisa ter bastante cautela com todas essas exigências. Então a gente está preocupado a todo momento a dar o melhor serviço, a secretária Marcela, o pessoal da Secretaria de Justiça está à disposição para que esse serviço, essa ação seja a melhor possível”, pontuou.

Por sua vez, Célia Moraes, da Desafio Jovem de Brasília, defendeu a união das entidades interessadas na causa em prol do bem daqueles que mais precisam. “Nós não somos concorrentes, nós somos como parte: cada um de nós fazemos parte de uma grande engrenagem. Nós somos peças que compõem uma grande engrenagem em prol de um bem, em prol de um objetivo. E esse objetivo é a vida daquele nosso irmão que está lá na rua sofrendo, que está passando por necessidades que nós desconhecemos, que são as mais variadas possíveis”, argumentou. “Então eu me coloco aqui a disposição. As portas da comunidade terapêutica estão abertas e estamos juntos. Eu estou nesse barco pra navegar em águas profundas. Tenho certeza de que as comunidades estão unidas nesse propósito. Contém conosco”, completou.

Areolenes Nogueira, do Instituto Crescer, entidade que lida diretamente com os moradores de rua, destacou que o Centro de Triagem para moradores de rua de sua instituição passa por algumas dificuldades para acolher essas pessoas, tais como: falta de encaminhamento médico e a falta de testes públicos para a covid-19. “Essa rede, rede SUS, rede SUAS, e esses serviços que existem, nós precisamos estar interligados, porque sozinhos a gente não consegue fazer. O nosso Centro de triagem não tem um centavo de dinheiro público. Nós trabalhamos lá com ajuda da sociedade. O Frei Rogério é um dos nossos parceiros. É ele quem coloca comida na mesa lá. Mas nós temos diversas outras despesas e diversas outras necessidades. Então num segundo momento, nós precisamos trazer essa rede pra andar junto. Sem essa rede a gente não consegue andar”, frisou.

Já Rogério Soares de Araújo, idealizador e coordenador da Rede Solidariedade do DF, comemorou a proposta do frei. “Acho que está todo mundo de parabéns pela atitude. Eu tenho andado pelas periferias quase que 24 horas por dia, e a população em situação de rua antes da pandemia era uma e agora é outra. Nós temos hoje no setor comercial Sul, aquele povo que está no Setor Comercial Sul não é povo de rua do Setor. A grande maioria foi para os acampamentos, são pessoas novas que estão chegando ali. E nós temos outras preocupações quando terminarem esses serviços o que é que a gente vai fazer. O que é que eu peço encarecidamente é para que a gente trabalhe”, colocou.

Já o Caio Valente, membro da coordenação do projeto “Por um setor sem miséria”, falou da importância de uma aliança duradoura entre os mais variados setores da sociedade, o que é muito mais do que os governos de plantão. “Se a gente pensar pequeno, a gente sempre fala “vamos começar pequeno”, e vamos expandindo. Para nós é uma alegria muito grande, porque governo sai e governo entra, mas a gente pode de alguma forma ajudar ou dentro ou fora. Nós temos gente aqui com anos de história”, observou.

Por Sérgio Botêlho Júnior

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