Em boa parte das repúblicas democráticas espalhadas pelo mundo, o poder central é dividido entre o Chefe de Estado – aquele responsável por representar o país e cuidar da administração do Estado – e o Chefe de Governo – incumbido de liderar e formular políticas públicas, econômicas e sociais, manter o funcionamento dos poderes executivo e legislativo, além de dialogar com os partidos, atores institucionais, Chefe de Estado e a população. Na Inglaterra, por exemplo, o Rei Charles III é o Chefe de Estado, enquanto Rishi Sunak é o Primeiro-Ministro que governa em nome de Sua Majestade.
No Brasil, por outro lado, as funções de Chefe de Estado e de Governo são exercidas pelo Presidente da República. Contudo, desde a criação do Centrão, surgido inicialmente em 1988, durante a Assembleia Nacional Constituinte, para designar os parlamentares que formavam a maioria, mas que hoje é conhecido por aglutinar um grupo formado por centenas deputados de diferentes partidos, que se unem para conseguir maior influência no parlamento e defender, de modo conjunto, seus interesses, o presidente da Câmara dos Deputados – geralmente eleito por meio da referida força conjunta – acabou se tornando uma espécie de Primeiro-Ministro, mas que possui mais poderes que o Chefe de Estado.
Para se ter uma ideia, na Inglaterra, Rishi Sunak pode ser derrubado pelo Monarca e pelo Parlamento, já no Brasil o poder para destituir o presidente da República está exclusivamente nas mãos do presidente da Câmara dos Deputados, o que já coloca o chefe da nação em posição de vulnerabilidade perante a vontade daquele que detém o poder de arquivar ou não os pedidos de impedimento contra o primeiro. Por isso, o afinado diálogo entre os líderes do Executivo e Legislativo é fundamental para garantir o bom andamento do país e de suas instituições.
Porém, desde o impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT), desencadeado pelo então presidente da Câmara, o agora ex-deputado federal Eduardo Cunha (MDB-RJ), uma das grandes lideranças do Centrão, o Brasil tem assistido a um crescimento exponencial do poder do parlamento perante as grandes decisões nacionais. Tal força foi, incomparavelmente, ampliada quando 11 legendas se uniram e elegeram o deputado federal Arthur Lira (PP-AL) para a Presidência da Câmara dos Deputados em fevereiro de 2021, onde permanece até os dias atuais.
O futuro nas mãos de Arthur Lira
Esse alinhamento, passadas as eleições gerais de 2022, tem feito com que o atual presidente da República Federativa do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), realize constantes tratativas junto ao deputado Arthur Lira para garantir a sua governabilidade, já que o Centrão possui centenas de deputados cuja ideologia vai do espectro do Centro à Direita, enquanto a esquerda possui somente 136 parlamentares na Câmara Federal, sendo que são necessários 257 votos para aprovar alguma coisa.
A importância de Lira, inclusive, tem sido muito reconhecida pelo presidente Lula em vários momentos do seu terceiro governo. Em uma de suas lives semanais, conhecida como “Conversa com o presidente”, Lula foi claro: “Conversar com Lira é uma obrigação minha, ele é presidente da Câmara. Os deputados não são obrigados a acatar uma medida provisória que o governo manda ou um projeto de lei sem mudar nada”, disse Lula. “É normal que os deputados não sejam obrigados a concordar com o governo e queiram mudança, então você discute a mudança. É assim que se faz política”.
Embora não haja nada de anormal na fala do presidente, a conversa com Lira é uma obrigação, porque a influência dele sobre sua base figura como um poder moderador da República nos tempos atuais. É por isso que, sob a liderança do deputado alagoano, o Centrão tem ampliado os seus espaços no governo petista em troca de apoio em importantes projetos para garantir a saúde das contas públicas do Brasil, tais como: o que visa a de taxação de offshore e de super-ricos, a reforma tributária e o novo arcabouço fiscal. Este último foi uma das grandes vitórias obtidas pelo governo no parlamento, após a benção e interferência do presidente da Câmara.
Por outro lado, o Governo Lula III enfrentará temas polêmicos, como a descriminalização do aborto, algo que é rechaçado pela ala conservadora do parlamento brasileiro, a qual aposta em Lira para fazer avançar a pauta anti-aborto.
E é meio a um mar de projetos que podem mudar os destinos do Brasil, para melhor ou pior, e inúmeros interesses que fazem os integrantes do Palácio do Planalto terem severas dores de cabeça, que Arthur Lira segue se consolidando como um grande primeiro-ministro, cuja base conta com vários expoentes da política brasileira e uma força capaz de garantir não somente a governabilidade, como também a estabilidade do país.
por Sérgio Botelho Junior