Dra. Katy Gondim fala sobre as conquistas e protagonismo da Canabis medicinal

A história da cannabis está sendo reescrita. De vilã a heroína medicinal, sua trajetória é um lembrete fascinante de como a percepção humana e o conhecimento podem evoluir. E enquanto os debates e estudos continuam, uma coisa é certa: a cannabis já plantou suas raízes no mundo da medicina moderna, prometendo um futuro mais verde e, quem sabe, mais aliviado.

Não é de hoje que a cannabis desperta curiosidade. Usada por milênios em diferentes culturas por suas propriedades psicoativas e medicinais, só recentemente ela ganhou holofotes pela sua eficácia cientificamente comprovada em tratar uma gama de condições: de dores crônicas a transtornos de ansiedade, passando por esclerose múltipla e até mesmo alguns sintomas relacionados ao câncer.

No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) já autorizou 30 produtos à base de cannabis. Farmácias de manipulação e empresas farmacêuticas já oferecem uma variedade de produtos como: óleos, cápsulas, sprays sublinguais e até adesivos transdérmicos. Cada formato visa atender a necessidades específicas de dosagem e administração, ampliando o acesso e a personalização do tratamento. Para explicar melhor sobre o assunto, a ImagineAcredite entrevistou a Doutorado em Farmacologia de Produtos Naturais e Sintéticos Bioativos pela Universidade Federal da Paraíba, Katy Lísias Gondim Dias de Albuquerque.

“Há muitos benefícios terapêutico da Cannabis e cada fitocanabinoides tem sua importância clínica no tratamento de diferentes doenças, como: Dor crônica, epilepsia refratária, Transtorno do Espectro Autista (artigo publicado por nós com alto nível de evidência científica), Náusea e vômito decorrente da quimioterapia, Alzheimer, Parkinson, doenças inflamatórias, dentre outras.

São mais de 250 fitocanabinoides presentes na planta, além dos demais metabolitos secundários (ex.: terpenos e flavonoides), que também apresentam efeitos terapêuticos, mas isso é quando a gente se refere ao óleo, pomada ou uso vaporizado das flores (ex.: excelente opção para dor crônica, pois essa via de administração promove efeito rápido e uma biodisponibilidade maior dos fitocanabinoides), no qual usamos a planta toda, como no caso dos extratos full spectrum”, explica a Dra.

De acordo com ela, os pacientes devem começar com uma dose baixa e ir aumentando gradativamente a dose a cada 3 dias, pois os fitocanabinoides obedecem a curva de “U” invertido, ou seja, menor a dose, maior efeito até a obtenção da “dose ótima” que é peculiar de cada paciente. A terapia com Cannabis é muito individualizada, por isso o paciente precisa ser acompanhado de perto.

“O CBD é muito eficaz no tratamento de epilepsia e doenças inflamatórias, por exemplo. Já o THC é muito eficaz no tratamento de dor crônica, espasticidade, náusea e vômito decorrente de quimioterapia, dentre outras doenças. A combinação dos dois é uma excelente opção no tratamento de diferentes doenças, incluindo nas elencadas acima. Verificamos em nosso ensaio clínico, randomizado, duplo-cedo e placebo-controlado que o óleo full spectrum de CBD melhora sintomas de ansiedade, agitação psicomotora e interação social de crianças de 5 a 11 anos com Transtorno do espectro Autista. O CBD também está sendo estudado na área da oncologia”, descreve a Dra.

Sem risco de Dependência Química

Um dos aspectos mais promissores dos medicamentos à base de cannabis é que não tem risco de dependência química. Enquanto opióides e benzodiazepínicos, comumente usados em condições de dor e ansiedade, respectivamente, têm alto potencial para dependência e efeitos colaterais severos, a cannabis apresenta um perfil de segurança mais favorável.

“Os possíveis efeitos colaterais associados ao uso de produtos à base de Cannabis em tratamentos médicos são sonolência, aumento de apetite, diarreia, dentre outros. Mas são efeitos colaterais bem leves comparados a alguns medicamentos tradicionais como os psicotrópicos, por exemplo, que podem causar nefrotoxicidade e hepatotoxicidade. É importante lembrar que a Anvisa, os Médicos e Odontólogos, Biomédicos e Fisioterapeutas estão autorizados a prescrever medicamentos à base de cannabis aos pacientes”, pontua a Dra.

Medicamentos gratuitos distribuídos pelo SUS

Um dos questionamentos dos nossos leitores é sobre a possibilidade dos medicamentos à base de Cannabis ser distribuído pelo Sistema Único de Saúde. Segundo a Dra. Albuquerque, algumas cidades como São Paulo (SP) e Campina Grande (PB) já permitem que os pacientes retirem o medicamento gratuito. E por estar chamando a atenção do país, o deputado federal Ricardo Aryes (Republicanos – TO) apresentou um projeto inovador, PL 481/23, que está atualmente em análise na Câmara dos Deputados

O PL promete um avanço significativo no acesso à saúde: a implementação de uma política nacional para a distribuição gratuita de medicamentos formulados com canabidiol nas unidades de saúde do SUS, abrangendo tanto estabelecimentos públicos quanto privados conveniados.

Além de medicamentos puramente à base de canabidiol, a lei também cobre a distribuição de remédios que combinam esta substância com outros canabinoides, como o tetraidrocanabinol. Importante salientar que tanto produtos nacionais quanto importados serão contemplados, desde que estejam em conformidade com as normas da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e prescritos por um profissional de saúde devidamente qualificado. Essa prescrição deve vir acompanhada de um laudo justificando sua necessidade.

Perspectivas para o futuro

Embora ainda existam muitas questões a serem respondidas e obstáculos a serem superados, o futuro dos medicamentos à base de Cannabis parece, sim, promissor. Mantendo a mente aberta e apoiando a pesquisa científica séria, podemos estar à beira de uma nova era na medicina, onde o que era velho (como a Cannabis) se torna o novo motor de soluções terapêuticas inovadoras. Então, será que o futuro é mais verde? Tudo indica que sim, mas sempre com aquele toque de cautela e muita ciência no comando.

“As perspectivas são excelentes, pois os produtos à base de Cannabis estão melhorando muito a qualidade de vida das pessoas que sofrem nas mais diferentes doenças e sem resposta terapêutica eficaz com o tratamento convencional. Nosso papel como Pesquisador é estudar cada vez mais para trazer embasamento científico e diferentes opções de tratamento para ajudar as pessoas. Estou pesquisando agora o efeito da pomada de Cannabis em pacientes com Epidermólise bolhosa, uma doença rara e grave, e nossa pesquisa está mudando a vida das pessoas. O nosso papel como Pesquisador e como ser humano é trazer alívio para o sofrimento do outro”, diz a Dra.

Quem é a renomada Doutora

Katy Lísias Gondim Dias de Albuquerque é Professora Associada da Universidade Federal da Paraíba. Possui graduação em Farmácia pela Universidade Federal da Paraíba (2000), Mestrado (2002) e Doutorado (2006) em Farmacologia de Produtos Naturais e Sintéticos Bioativos pela Universidade Federal da Paraíba em colaboração com Universidade de São Paulo (USP- Ribeirão Preto).

Ela é Chefe da Disciplina de Farmacologia e fundadora da Disciplina Sistema Endocanabinoide e Perspectivas Terapêuticas da Cannabis Sativa L e seus derivados, em 2019, primeira disciplina sobre Cannabis em Universidade Pública (UFPB) do país ofertada para os cursos de Medicina, Biomedicina, Farmácia, Enfermagem, Odontologia, Nutrição, Fonoaudiologia, Terapia Ocupacional e Biotecnologia. Fundadora e Coordenadora do PEXCANNABIS UFPB (Pesquisa e Extensão em Cannabis Medicinal da UFPB).

Além disso, é Professora Titular do Programa de Pós-Graduação em Cannabis Sativa da Sociedade Brasileira de Estudos da Cannabis (SBEC). Participa como Professora convidada do Programa de Pós-Graduação em Neurociência Cognitiva e Comportamento e do Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Universidade Federal da Paraíba. Fundadora, em 2018, da Sociedade Brasileira de Estudos da Cannabis (SBEC). Editora-chefe da Revista Brasileira de Cannabis.

Ademais, é Pesquisadora do Centro de Pesquisa Clínica do Hospital Universitário Lauro Wanderley/EBSERH/UFBP. Líder do grupo de Pesquisa Básica e Clínica da Área da Saúde do CNPq, atuando na linha de pesquisa: Pesquisa Não-clínica e Clínica com Cannabis sativa e seus derivados. Possui experiência em Pesquisa Clínica, Atenção Farmacêutica, Farmácia Clínica e Acompanhamento Farmacoterapêutico. Vem atuando em Pesquisa clínica com produtos à base de Cannabis sativa em diferentes doenças: Epilepsia Refratária, Transtorno do Espectro Autista (TEA), Epidermólise Bolhosa (EB) e na área da Odontologia.

Nota: Essa matéria é para fins informativos e não substitui o aconselhamento médico profissional.

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