Na tarde da última quarta-feira, 03, o Estado de Sergipe e todos que fazem a Obra Social Nossa Senhora da Glória, popularmente conhecida por Fazenda da Esperança, recebeu a triste notícia sobre o passamento do bispo emérito da Diocese de Propriá, Dom Mario Rino Sivieri, de 78 anos. Ele estava internado há oito dias, em um hospital particular da capital sergipana, Aracaju, para cuidar de uma Erisipela, mas faleceu devido à contração de uma pneumonia e problemas cardíacos que culminaram com um Acidente Vascular Cerebral (AVC).
A morte do clérigo surpreendeu a todos, mas também serviu para demonstrar o quão radical ele foi em sua missão de ser “O Servo de Todos”, como diz o seu Lema Episcopal, sobretudo dos menos favorecidos e das pessoas que sofriam com a dependência química. Tanto é que há dois anos, ele vivia refugiado em uma casinha modesta, que foi construída por amigos, na Fazenda da Esperança São Miguel, localizada na zona rural de Lagarto.
Lá, assim como na cidade e em todo o estado, Dom Mario marcou gerações pelos seus gestos de amor e dedicação. Um exemplo disso é que nas três Fazendas da Esperança que ajudou a fundar em Sergipe, ele era visto como um pai. Um pai que sabia ouvir, aconselhar, nortear e ser um porto seguro para aqueles que a ninguém poderia recorrer. Por isso, em especial para a mencionada comunidade terapêutica, ele partiu deixando uma imensa lacuna, além do espírito encorajador diante das dificuldades.
Para Nelson Giovanelli, fundador da Fazenda da Esperança, o bispo deixou algo muito grande plantado no coração de todos. “Se não fosse ele, a Fazenda e a Família da Esperança seriam diferente”, disse. Já o frei Hans Stapel, também fundador da Fazenda, destacou Dom Mario exerceu o seu sacerdócio com muita disposição. “Tenho certeza de que ele vai fazer muito lá do céu, principalmente neste momento em que acolhemos tantos jovens das ruas, homens e mulheres. Temos agora mais um bispo no céu, mais um fazendeiro e isso nos motiva para amarmo-nos e vivermo-nos bem, porque a qualquer momento vai ser a nossa hora”, completou.
O presidente internacional da Fazenda da Esperança, Padre Luiz de Menezes, que é natural da cidade de Lagarto, onde o bispo é carinhosamente chamado de Padre Mario, lembrou das vocações religiosas que o clérigo ítalo-brasileiro impulsionou. “Mas não poderia deixar de expressar a nossa gratidão a ele por ser um entusiasta da Fazenda da Esperança e que motivou a mim, ao Pe. Anderson, e tantos outros a fazerem esta experiência, há 30 anos e que depois acompanhou e participou do crescimento desta obra, até que como bispo emérito veio morar na fazenda, concluindo assim sua missão na terra.
Nossa gratidão a Deus pela vida fecunda de Dom Mário, acreditamos que ele continua nos acompanhando e intercedendo a Deus por nós e por nossa missão que continua. Pelo seu testemunho, acreditamos que se realiza nele a frase de São Paulo: “Sei em quem coloquei a minha fé”, colocou o presidente.
Já o fundador da Casa do Menor no Brasil, padre Renato Chiera, lembrou que Mario era italiano, que tinha a mesma idade que ele e que era uma figura muito importante. “A gente se via pouco, porque estávamos longe. Mas quando nos encontrávamos, era uma festa. […] Mas isso me fez refletir que penso muito a morte dos outros, mas e a minha? Por causa dele, vejo que o que vale mesmo é amar”, observou.
Uma vida plena e corajosa
Mario Rino Sivieri, natural da Castelmassa, na Itália, viveu uma vida plena, dedicada e, acima de tudo, ousada. É que aos 10 anos de idade, ele resolve largar tudo e ingressar no seminário; aos 25 toma a decisão de vir ao Brasil para ser missionário em Sergipe, onde comandou paróquia, liderou movimentos pela fé, ajudou fundar três Fazendas da Esperança e inspirou uma legião de pessoas a seguirem os seus sonhos, por mais difíceis que fossem, bem como ajudou a resgatar vidas desgraçadas pelas drogas.
E sua ousadia e coragem lhe acompanharam até na velhice, quando aos 75 anos, anuncia a sua aposentadoria episcopal da Diocese de Propriá e decide não retornar a Itália e viver junto a sua família, mas manter-se no Brasil junto aos acolhidos da fazenda instalada em Lagarto. Lá, ele foi muito bem recebido e abraçado por todos os que viviam na comunidade terapêutica e também por toda a sociedade sergipana. Foi um legítimo servo de todos, tanto é que ele estava sempre na linha de frente em defesa dos seus acolhidos. Um verdadeiro pai!
E esse espírito e legado paterno está vivo entre nós que fazemos o projeto Imagineacredite. É que o bispo sempre foi nosso grande motivador. Ele nos ajudava a manter o projeto vivo e ainda se preocupava com nossas andanças país afora. Diante disso, para o jornalista Sérgio Botelho Júnior, por exemplo, que conviveu com ele por pelo menos quatro anos, Dom Mario foi um verdadeiro pai.
“Há 30 anos ele vinha lutando pelo crescimento da Fazenda da Esperança e, para mim foi fantástico viver ao lado dele e presenciar experiências de amor ao próximo e sem julgamento. Ele sempre me aconselhava, sempre me impulsionava com coragem, sem medo e sempre acreditando no amor e na misericórdia divina. E uma coisa que me chamou bastante atenção foi num certo dia em que estava na casa com ele, e chegou uma pessoa que tocou na cigarra e todos que tocavam ele sempre atendia. Não queria nem saber quem era.
Ai, certa vez, eu perguntei se ele não tinha medo de abrir a porta e ser um ladrão. Então ele respondeu: ‘É Jesus que está chegando e ele precisa entrar’. Então ele não tinha medo do que viesse pela frente, ele sempre tinha esse amor e essa confiança em Deus. Chegou um rapaz com a cabeça sangrando, super drogado e pedindo para ir para a Fazenda da Esperança. Então ele olhou bem sério para o rapaz, buscou um pano e água e começou a limpar a cabeça do rapaz, num gesto de muito amor, assim como Jesus limpava as chagas do povo. Depois disso, ele organizou tudo e o levou para a Fazenda da Esperança. Então essa foi a maior prova de amor que vi dele, fora as experiências que tive. Então eu tenho muito orgulho e muita gratidão por tudo que ele fez na minha vida nesses quatro anos em que convivi com ele”, comentou o jornalista.
Por Sérgio Botelho Junior