Cerca de 35 milhões de pessoas, no mundo, sofrem com o flagelo das drogas, um inimigo mortal e, muitas das vezes, silencioso. Para entrar nessa estatística, são diversos fatores que levam um ser humano a conhecer uma falsa ilusão de felicidade. E quando os dependentes químicos estão em seu último estágio, e desejam se recuperar, buscam acolhimento e tratamento humanitário ofertados pelas comunidades terapêuticas.
Só no Brasil, existem mais de 2 mil CTs, acolhendo mais de 80 mil adictos, prestando serviço relevante ao país ao reinserir, de forma digna na sociedade, uma nova pessoa restaurada. Nesse contexto, entra a história da Cruz Azul, uma das primeiras entidades no mundo, que começou os trabalhos na Suíça, em 1877, quando o Pastor luterano Louis-Lucien Rochat, percebendo o expressivo número de famílias que enfrentavam a problemática da dependência do alcoolismo, esmerou-se em encontrar alternativas de ajudar e acolher essas pessoas, oferecendo apoio e ajuda a essas pessoas.
“Convicto de que a Palavra de Deus tem poder para mudar os aspectos da vida moral, espiritual e social do homem, iniciou uma série de reuniões – estilo grupos de mútua ajuda, oferecendo ajuda através da Palavra de Deus e promovendo o compromisso da abstinência, para vencer a dependência do álcool. Dessas reuniões surgiu o trabalho da Cruz Azul, que posteriormente expandiu-se e hoje presente em 38 países. A sede da “International Blue Cross – IBC” está localizada em Berna, Suíça. Além de ser membro consultivo permanente da OMS (Organização Mundial de Saúde) na temática do uso, abuso e dependência do álcool e outras drogas e membro ativo da EUROCARE (European Alcohol Policy Alliance). A EUROCARE é a grande Rede Europeia que se concentra exclusivamente em questões de políticas sobre o álcool”, explica o presidente da Cruz Azul no Brasil, Rolf Hartmann.
Em terras brasileiras, a entidade começou o movimento em 1982, como grupo de apoio, e em 1983 como comunidade terapêutica, na cidade Panambi, Rio Grande do Sul. “Curt e Anita Reinke, cristãos, ele metalúrgico de uma grande indústria, tinha um colega de trabalho com sérios problemas de alcoolismo e que, por muitas vezes, procurou sua ajuda para abandonar a bebida alcoólica. Curt encaminhou seu amigo para vários serviços de ajuda que existiam no início dos anos 80, na região e até na capital, Porto Alegre. No entanto, Curt e sua esposa Anita, entendiam que além do tratamento médico, farmacológico e psiquiátrico a ajuda espiritual, a Palavra de Deus podia contribuir para o tratamento de uma pessoa alcoólica.
Porém, nas propostas de trabalho para onde encaminhavam o amigo com problemas, não estava inserida a espiritualidade nos programas de tratamento. A partir de sua mãe, imigrante alemã, tomou conhecimento do trabalho da Cruz Azul da Alemanha (e do trabalho internacional), que tinha como proposta de trabalho a partir da Palavra de Deus. Animados com a descoberta, em 1982, o casal juntou economias e viajou para a Europa para visitar e conhecer um pouco mais da proposta da Cruz Azul da Alemanha e Internacional. Retornaram ao Brasil, com a decisão de implantar e trabalhar com a proposta da Cruz Azul Internacional, tanto nas áreas do tratamento, prevenção e no trabalho de grupos de apoio mútua ajuda”, descreve Hartmann.
Em 1989, surge a segunda comunidade terapêutica, com base na proposta da Cruz Azul: é fundado o Centro de Recuperação Nova Esperança – CERENE, na cidade Blumenau, SC. Mais tarde outras comunidades terapêuticas e grupos de apoio vão surgindo, ou aderindo à proposta da Cruz Azul, até que em 23 de junho de 1995 é criada e organizada a Cruz Azul no Brasil, como Federação, e com sede na cidade de Blumenau, Santa Catarina. “A Cruz Azul é hoje um trabalho diaconal, de assistência social, de promoção da saúde, e se destina a todos quantos necessitarem, sem distinção de cor, raça, sexo, nacionalidade, estado civil, profissão, credo religioso ou político. Reconhecida como Centro de Referência em Dependência Química (CEREDEQ), pelo Governo Federal”, pontua Hartmann.
Programas de Atendimento
Para resgatar a vida do dependente químico e oferecer a chance de uma nova história, a entidade conta com vários programas, como de grupos de apoio e mútua ajuda, que oferece treinamento, assessoramento, apoio e acompanhamento de lideranças e voluntários junto às igrejas e outras entidades, objetivando a criação de uma rede para o atendimento de dependentes e seus familiares, com grupos para adultos, crianças e adolescentes, separadamente e com metodologia própria.
Já para a prevenção são realizadas atividades em escolas, empresas, igrejas e outros espaços comunitários, através de teatros, monólogos, discussões de grupos, palestras de conscientização, e a capacitação de multiplicadores, seguindo as prerrogativas internacionais de prevenção. Além disso, a entidade oferece educação continuada, com a realização de cursos, seminários, fóruns, curso de pós-graduação (em parceria com a Faculdade Luterana de Teologia – FLT) para a capacitação e formação de pessoas que atendem o público na área de cuidados e prevenção ao álcool e outras drogas.
Outro ponto a se destacar é a orientação e apoio para os dependentes e seus familiares, com atendimento presencial psicológico e de orientação junto à sede da Cruz Azul e também via telefone, e-mail e rede social. Já para a construção de políticas públicas sobre drogas, a entidade conta representação do segmento de CT’s e do público-alvo de familiares e dependentes junto aos governos federal, estadual, distrital e municipal, contribuindo na discussão e aprovação de leis e o financiamento público que promovam serviços de atenção e/ou cuidado a pessoas afetadas pelas drogas, e as Organizações da Sociedade Civil (OSC) atuantes nesta área e nas políticas sobre drogas.
Nova PNAD
Durante anos, as comunidades terapêuticas no Brasil não eram reconhecidas como prestadoras de serviço essencial na prevenção e combate às drogas. Graças ao governo Bolsonaro, em 2019, com a publicação da nova Política Nacional sobre Drogas, o segmento foi fortalecido, inclusive ampliou o financiamento do número de vagas ofertadas para os adictos, além de estabelecer regras claras de funcionamento e fiscalização.
“Pela primeira vez tem-se uma política sobre drogas intersetorial e transversal, permeando todo o governo, pautado nos melhores estudos e pesquisas da área sobre drogas. A PNAD deixou de ser uma política Saci-Pererê, de uma perna só, antes pautada quase que exclusivamente na redução de danos, e agora pautada com o objetivo de promover a vida, a saúde e a abstinência. No tocante à prevenção ainda há carência de projetos nacionais e de recursos, mas com o início do desenvolvimento do Sistema Nacional de Prevenção, fundamental, que, junto com o Plano Nacional sobre Drogas foram dados passos decisivos para a mudança dessa realidade”, observa.
Durante a entrevista, Hartmann elogiou a equipe e o trabalho da Secretaria Nacional de Cuidados e Prevenção às Drogas e a política de redução de oferta das drogas, que converte as apreensões em recursos reaplicados na PNAD. “A Senapred tem sido excelente, aliando excelência técnica, científica e de gestão, contemplando e integrando a rede de atenção e cuidados, destacando e fomentando a todas áreas e segmentos. O grande desafio ainda é prover a PNAD com recursos condizentes e necessários, tanto na redução de demanda, como de oferta, especialmente na área da prevenção ao uso abusivo e dependência de drogas”.
Segundo Hartmann, o melhor investimento que se pode fazer é na vida. “A dependência química não precisa ter a última palavra. Há esperança, há solução, há superação. Estamos à disposição para servir e estar ao lado das famílias, dos dependentes, a prevenir, a caminhar juntos, unidos, na promoção da vida e na superação do problema da drogadição”, finaliza.
Ascom ImagineAcredite
