Com o apoio do Papa, Bispo Emérito dedica-se a comunidade terapêutica

Prestes a completar a idade necessária para deixar o governo pastoral da Diocese de Propriá, Dom Mario Rino Sivieri andava para lá e para cá com a seguinte dúvida: permanecer no Brasil ou retornar à Itália? E assim foram meses de reflexão até que o clérigo resolveu permanecer no Brasil, mais precisamente na cidade de Lagarto, localizado no interior do Sergipe, o menor estado da federação brasileira.

Mas por que Sergipe? Por que Lagarto? Por que não retornar à Itália e reencontrar os seus familiares? A resposta é simples e repleta de sentimentos que Mario Rino Sivieri foi capaz de captar nesses quase 50 de estada em terras sergipanas. “Eu poderia voltar à Itália, mas três motivos são responsáveis para ficar no Brasil. Primeiro: eu posso ser útil aqui, explorando as possibilidades; o segundo motivo está ligado ao clima. Não há frio nessa região. E terceiro, a assistência humana, pois aqui estão meus amigos, o que faz a vida ter mais sentido”, sintetiza o Bispo Emérito da Diocese de Propriá.

Após resolver ficar em terras tupiniquins, em junho de 2016, portanto há um ano do anúncio oficial, Dom Mario foi ao Vaticano para uma audiência com o Papa Francisco, a qual celebrava os 50 anos da ordenação dos padres do Papa Paulo VI – responsável por enviar sacerdotes a diversas nações do mundo ocidental, na década de 60. Entretanto, o então bispo de Propriá ainda não sabia o que dizer ao Sumo Pontífice, foi quando ele lembrou da sua escolha pela recuperação dos dependentes acolhidos pelas Fazendas da Esperança.

“Então, quando chegou a minha vez, eu olhei para ele e disse que já estava se aproximando a minha aposentadoria episcopal e que eu tinha resolvido ir morar na Fazenda da Esperança juntos aos acolhidos. Ele então demonstrou muita alegria e, acompanhado de um gesto impulsionador, ele me disse: ‘Vá em frente’!”, relata o clérigo.

Com a chancela do papa argentino, em julho de 2017, sete meses depois, em um jantar beneficente organizado por membros da Fazenda da Esperança e amigos lagartenses, a que convivera por 29 anos, Dom Mario anuncia o seu retorno em definitivo. A medida foi comemorada por todos que ali estavam, mas principalmente pelos jovens acolhidos da Fazenda São Miguel que passariam a conviver diariamente não somente com um bispo, mas sim com um pai presente, que aconselha, que cuida e, sobretudo, que ouve. Qualidades importantes para a recuperação de vidas abaladas pelas drogas da vida humana, como lembrou o então coordenador da Fazenda da Esperança São Miguel, Maurício Bovo.

“Um jovem que busca a recuperação precisa de alguém que o escute com o coração e o Bispo tem essa característica. Então ele estando à disposição desses jovens, representará um sinal muito grande de amor para cada um”, destacou o também ex-acolhido Maurício Bovo.

Dentro da Fazenda da Esperança Dom Mário é visto como um pai e ele mesmo reconhece e sente tal atribuição no semblante dos jovens. “A gente dar a vida por eles, então sentimos a paternidade com todo o bem que se faz”, diz o clérigo.

Mas para além da sua participação na fundação de três fazendas em Sergipe, o religioso possui uma história de vida que o aproxima, emocionalmente, dos jovens acolhidos pela comunidade terapêutica regeneradora. Uma vez que estes, em sua maioria, não tiveram um pai presente em suas vidas, assim como Mario, que pouco pôde conviver com seu genitor, devido a II Guerra Mundial e a sua vinda para o Brasil em 1968. Mas nem isso o desmotivou.

Ao desembarcar em Sergipe, Mário fez-se o Servo de Todos e trabalhou não somente para a agitação e crescimento da fé cristã católica, como também intercedeu nas causas sociais. Este é somente um exemplo sob o qual se pode constatar que o religioso sempre se recusou a abaixar a cabeça perante as injustiças e mais uma e pela última vez optou por dedicar os seus últimos dias de vida aos que mais precisam dele.

Agora, embora o peso da idade caia sobre seu corpo, Dom Mario segue contribuindo com os trabalhos e com os jovens acolhidos na Fazenda da Esperança São Miguel. Com uma rotina de poucos compromissos, o bispo escuta, aconselha e acompanha as atividades desenvolvidas naquela comunidade terapêutica. Inclusive, intervém por ela junto às autoridades locais. Em março de 2018, por exemplo, Dom Mario solicitou ao prefeito Valmir Monteiro a construção de um novo aterro sanitário, pois o que havia estava exalando fumaça para dentro da comunidade, bem como para um residencial entregue pelo governo federal.

Pois bem, passaram se quatro meses até que a Prefeitura Municipal de Lagarto, por meio da Secretaria Municipal do Meio Ambiente, desse início a capacitação dos catadores de lixo e a prática da coleta seletiva de lixo. Com isso, o Município espera gerar renda para as famílias dos catadores e pôr fim a fumaça do lixão, uma vez que lá passará a receber somente lixo orgânico, portanto, não inflamável.

Além disso, o Bispo Emérito de Propriá também tem buscado parcerias junto ao Governo do Estado, para ampliar e garantir a continuidade do convênio entre o governo e a entidade. Sem contar que, em suas viagens a Europa, o clérigo além de visitar a família e participar de eventos religiosos ligados, por exemplo, aqueles ligados ao Movimento dos Focolares, Dom Mario também aproveita para solicitar apoios para a Fazenda da Esperança junto aos amigos do velho continente.

Presente nas três fazendas instaladas no estado, sobretudo nas duas instalas em Lagarto, onde ele reside atualmente, além do trabalho sócio espiritual junto aos acolhidos, o religioso também celebra missas diárias, e já conseguiu – por meio de parcerias – restaurar a infraestrutura agropecuária, bem como aquelas utilizadas para acolher os jovens e receber visitas. Tudo isso, sem citar o seu empenho em conseguir recursos para a obra, por meio do estímulo à divina providência, considerada um dos fatores chaves para a instalação da comunidade em Lagarto.

Por tudo isso e por ser um homem que dedicou sua vida aos outros, a verdade é que Dom Mario é alvo de muito respeito e admiração pela ampla maioria dos que fazem a sociedade e a política sergipana. Por isso que é em meio aos acolhidos da Fazenda da Esperança que ele recebe sucessivas visitas de famílias dos acolhidos, amigos de todo o mundo, autoridades, empresários e demais católicos, justamente em uma residência construída para ele, dentro da citada comunidade com recursos oriundos de doações de membros da sociedade sergipana.

Escolha tem precedentes

A escolha de Dom Mário não é a única na história das Fazendas da Esperança. Entretanto, como destacou o frei Hans Stapel Ofm, fundador da Obra Nossa Senhora da Glória, a presença do Bispo Emérito de Propriá entre os acolhidos fortalece o Carisma da Esperança.

“Para nós, quando os bispos decidem viver conosco, significa dizer que é a igreja entre nós. Isso torna o carisma sempre mais pleno, o que é uma alegria muito grande saber que a partir de agora a fazenda está mais completa”, comemorou o frei Hans.

Por Sérgio Botêlho Júnior

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