Em entrevista concedida à Revista ImagineAcredite, durante a 79ª Semana Oficial da Engenharia e da Agronomia, o professor da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC/GO) e do Instituto Federal de Goiás (IFGO) e pós-doutor em Engenharia Ambiental Antônio Pasqualeto alertou para a importância de medidas em prol da produção e preservação de água para o presente e o futuro do Brasil.
Segundo Pasqualeto, por conta das mudanças climáticas, as autoridades governamentais precisam tomar uma postura mais ativa sobre o assunto, porque o panorama hídrico atual aponta para grandes dificuldades. “A realidade imposta sempre vai ser de extremos! Então vamos ter secas e excessos de chuvas no Sul; no Centro-Oeste, a princípio, teremos tendência a maiores eventos de seca com redução da precipitação hídrica e elevação da temperatura; na Amazônia, teremos extremos de secas prolongadas e de cheias, porque a medida em que vai desmatando, vai aumentando o transbordamento dos córregos e o assoreamento; e no Nordeste tende a ter as chuvas costeiras, com maior aridez na região central. A tendência do Cerrado é caminhar no sentido da Caatinga e o da Caatinga é ficar mais árida ainda, o que muda toda a fauna e flora que inclusive terá que se adaptar a uma nova realidade devido a maior incidência de radiação solar”, explanou.
Diante deste cenário, o professor ressaltou que as chuvas que caem sobre as regiões Centro-Oeste e Sul podem ficar irregulares, o que tornará a atividade agrícola em uma atividade de risco que exigirá um seguro contra imprevistos. Ele também observou que as queimadas registradas nos últimos dias são outro fator agravante frente ao panorama atual da situação hídrica do país.
“As queimadas, por si só, já provocam a elevação da temperatura, mas acrescenta-se o fato de que quando você queima algo, você transforma o material orgânico em poluição e um dos componentes importantes é o CO2 e o Monóxido de Carbono, que afeta a qualidade e a saúde da população. Agora o CO2 é o principal contribuinte do efeito estufa, se nós aumentamos a temperatura do planeta, nós alteramos toda a dinâmica hidrológica e o planeta busca o seu estado de equilíbrio, para tentar dissipar essa energia. Então há uma tendência de se evidenciarem com mais frequência situações como terremotos, maremotos, tsunamis ou furacões, como está acontecendo agora nos Estados Unidos, e alterações no ciclo hidrológico”, argumentou.
E completou: “Esses extremos ambientais estão a exigir dos governantes uma postura muito mais ativa do que reativa, então não basta apenas reagir, você tem que se antecipar aos fenômenos, porque só temos esse planeta, não temos um planeta B. A Terra é nosso local e ele deve estar em condições habitáveis”.
Para corroborar com toda a situação, Pasqualeto destacou que a quantidade de chuva tem diminuído em algumas áreas do país. “Nós tivemos em Goiás, estudos que demonstram que de 1979 a 2015, houve uma redução de 3,7mm de precipitação por ano. Chove em Goiânia 72 dias e os dias chuvosos estão diminuindo, sem considerar que estamos aumentando a temperatura e isso vai repercutir em uma série de problemas que não só afetam o sistema produtivo brasileiro, como também na saúde pública da população. Então aquilo que não se investir na preocupação ambiental, terá obrigatoriamente um custo maior na saúde pública”, alertou.
Diálogo, consenso e ação
Mas como promover a unidade em torno da causa ambiental em meio a tanta diferenças nas esferas política e governamental? Em resposta, o professor Pasqualeto lembrou que as crises servem como um fato motivador.
“Recentemente, eu perguntei a uma pessoa de Alta Floresta, no Mato Grosso do Sul, como eles conseguiram implantar um programa ambiental no município. Ela disse: “Não foi difícil, precisou a cidade de Alta Floresta ser a primeira colocada nas queimadas brasileiras para que ninguém mais quisesse investir lá e ao momento em que ninguém queria mais investir no município e ser taxado como queimador ou Nero do Século XXI, tanto o prefeito, quanto os vereadores e a sociedade se uniram em busca de uma solução”. E hoje Alta Floresta tem um excelente programa de proteção as nascentes e está moldando aquela imagem que tinha anteriormente”, exemplificou.
Para o professor, a unidade em meio as diferenças é mais do que necessária para que o país não perca investimentos estrangeiros. “Para que a gente seja a liderança internacional na preservação ambiental e tenha voz e vez, temos que caminhar para esse tipo de atitude, que nossos biomas garantem e nós temos uma disponibilidade de recursos naturais para poder ensinar ao mundo a fazer o que ele não fez”, salientou.
O professor e engenheiro agrônomo também demonstrou preocupação com o panorama de extremos para o país. “Se por um lado temos excesso de chuva no Sul, do outro temos seca no Norte no país, o que vai desafiar as autoridades, os governos e os comitês de bacias hidrográficas de tal forma que a gente tenha possibilidade de se antecipar a essas crises para dar uma tranquilidade para a população no abastecimento de água mais a economia, incluindo todos os setores que fazem uso da água. E aí trazendo para o setor agropecuário é mais preocupante ainda, porque é o PIB brasileiro e a agricultura é uma atividade de risco e mais ainda se a quantidade de água não for suficiente para a produção”, argumentou.
Água para todos é o grande desafio que tem solução
Na avaliação do professor Pasqualeto, o grande desafio do Brasil é garantir a qualidade e a oferta de água para todos os tipos de uso. “Manter essa regularidade depende do ciclo hidrológico que envolve todas as etapas: Evaporação, transpiração, condensação, precipitação, infiltração e escoamento superficial. O que está acontecendo é que estamos desregulando o ciclo hidrológico, atrapalhando fenômenos de transpiração com a derrubada das matas, chuvas intensas em curto espaço de tempo em áreas urbanas hipermeabilizadas, muito escoamento superficial que, se não for retido, em duas semanas está no oceano e a gente acaba perdendo água para o continente. Então este, para mim, é o grande desafio: manter a oferta de água em uma economia extremamente dependente de recursos hídricos, porque nosso PIB em grande parte é agropecuário”, justificou.
Por conta dessa necessidade contínua de água e para mitigar os impactos das mudanças climática, ele pontuou algumas medidas importantes. “Uma primeira grande medida é o estoque de água e quando digo isso, estou falando de manter a água no continente, infiltrar ela no perfil do solo, nós temos espaço poroso e isso inclui estratégias variadas, desde curvas de níveis, plantio direto, maneiras de você reter água com cacimbas, reservatórios, além de matas ciliares – que não é mais do que a legislação exige, mais programas produtores de água, que seriam a ampliação das reservas legais e valorização da natureza. Essa seria a primeira grande medida”, detalhou.
A segunda medida defendida por ela é a valorização do meio ambiente, por meio dos programas conhecidos como o PSA – Pagamentos por Serviços Ambientais. Esta medida, segundo ele, tem o objetivo de reconhecer os serviços oferecidos pela natureza. “Como se atribui valor as coisas ambientais? Elas fazem parte de um custo de produção, a água, como fator limitante, por exemplo, na produção de arroz, responde por 20% do custo de produção. Então temos que atribuir valor a simples existência de uma cachoeira, de uma queda dágua, porque é importante para a oxigenação, para a biodiversidade e o fato dos serviços ambientais que são oferecidos e que muitas vezes usufruímos de forma gratuita”, explicou.
E completou: “O terceiro é fundamental: mudança de comportamento! Nós temos que compreender que nós somos inquilinos no planeta e como tal, nosso tempo é limitado e temos que devolvê-lo em igual ou melhor estado do que aquele que recebemos. Isso pressupõe uma mudança de comportamento e percepção da nossa condição humana que seria a educação ambiental, para que possamos usufruir dos recursos da natureza sem necessariamente fazê-los faltar para a geração futura. Seria o conceito de desenvolvimento sustentável que passa por educação ambiental e mudança da cultura de nossos filhos para que eles possam preservar o planeta para que não deixemos um legado de destruição”.
Essas três medidas, na visão de Pasqualeto, fazem parte de um pacote composto por cinco medidas importantes para a garantia da disponibilidade de água em todo o país. “Não bastam apenas legislações! Nós temos a Politica Nacional de Recursos Hídricos, a Lei 9.433/97, o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, a Agência Nacional de Águas e Saneamento, as secretarias estaduais e os comitês de bacias hidrográficas, mas há a necessidade de uma mudança de comportamento da sociedade para se reduzir o consumo, mas também a estratégia de prevenção para poder melhorar a disponibilidade hídrica, no fator quantidade, e melhorar a qualidade hídrica. Para isso, há cinco instrumentos importantes: O plano de bacia hidrográfica, os critérios e outorga de recursos hídricos, o enquadramento no fator de qualidade da água, outro critério importantíssimo é a cobrança de recursos naturais, é você pagar pela água enquanto a sua natureza e não pelo tratamento, e o quinto fator é o compartilhamento de informações para que a sociedade possa ser assertiva na escolha de seus representantes e esses representantes possam ser estratégicos em ações onde o investimento possa ser reverberado em melhor qualidade e disponibilidade de água para todos os tipos de uso”, detalhou o especialista.
Por Thiago Farias